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quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

“Vejo com felicidade esse país extraordinário com liberdade em todos os cantos”

José Sarney. Senador relembra fatos importantes de sua trajetória como presidente da República e parlamentar.
Fim de ano é sempre uma boa ocasião pra se fazer reflexões a respeito do que passou. E foi nesse sentido que o ex-presidente da República, José Sarney (PMDB-AP), atual senador pelo Amapá, falou ao programa Luiz Melo Entrevista na última sexta-feira, 20, um dia depois de recepcionar a imprensa e amigos em seu jantar de confraternização. Sarney relembrou os avanços e conquistas desde sua passagem pelo Planalto e também as realizações de seus mandatos como parlamentar pelo estado. Falou de tudo um pouco, como Mandela, reeleição, energia, proteção ao meio ambiente e outros temas. Os principais trechos da entrevista o Diário do Amapá publica a seguir. Acompanhe.

Pergunta- A Universidade Federal do Amapá foi criada pelo senhor, quando ainda era Presidente da República, não é?
Sarney – Por mim, sim. Tive a oportunidade de assinar o decreto criando a Universidade, que também tem prestado um grande trabalho há tantos anos à juventude do Amapá, que antes para se formar ia para Belém e outros lugares. Os que aqui ficaram ajudaram a Unifap a crescer e a se transformar. Ela vem se modificando com mais oferta de cursos e hoje tem presença importantíssima na cidade, formando os jovens amapaenses, com boa qualidade.

Pergunta – É verdade que essa obra do Linhão do Tucuruí pelo projeto original não deveria passar pelo Amapá?
Sarney – É verdade, quando foi projetado se fazer o Linhão do Tucuruí era para atender Manaus, que era uma grande zona industrial e que consumia muita energia e essa energia era produzida por motores a óleo a um preço exorbitante, muito grande. Então o governo federal decidiu fazer a obra, o que significava que dentro de três anos o custo seria pago com a diferença do custo de energia que deixariam de pagar. Quando eu vi o projeto observei que passaria pela margem direita do rio Amazonas, então falei com a então ministra Dilma Rousseff e disse-lhe que nós deveríamos atravessar o rio Amazonas e pela margem direita trazer energia para o Amapá, também, num ramal da linha que seguiria para Manaus. O argumento dos técnicos era de que nós não tínhamos consumo nenhum que justificasse aquilo que consideravam um gasto extraordinário e sem retorno.

Diário – E como o senhor conseguiu convencê-la do contrário?
Sarney – Eu disse a ela que o Amapá iria crescer muito ainda, pois já tínhamos conseguido a Área de Livre Comércio e que tínhamos aprovado a Zona Franca Verde e que o Amapá também iria ter um grande parque mineral. Mas que para isso era preciso que o Amapá tivesse energia. Ela, contra todos os pareceres e opiniões dos técnicos, decidiu autorizar a modificação do projeto original. Hoje a energia de Tucuruí já está aqui em Macapá. Só não está sendo distribuída porque não temos concluída a estação abaixadora, porque ela vem em 230 kva e precisamos abaixar para 12,8 kva, que é o padrão aqui da cidade.

Pergunta – O senhor acredita que a partir daí a Zona Franca Verde deslancha, então?
Sarney – Sem dúvida. O Amapá agora está preparado para ser um grande estado, com infraestrutura e eu fico feliz porque idealizei isso, pensei nisso desde que cheguei aqui, quando trouxe o porto que era em Belém e construímos em Santana um terminal de contêineres e fizemos a Área de Livre Comércio. Agora estamos trabalhando para regulamentar a Zona Franca Verde e tocar a Zona de Processamento de Exportação, a ZPE, trazendo fábricas, inspirando confiança para atrair o capital brasileiro como também o estrangeiro, pois assim poderemos atender as outras demandas diárias que afetam o povo. Essa é a grande tarefa para garantir o futuro.

Pergunta – Daí a importância na formação da nossa mão de obra.
Sarney – Sim, pois além da universidade, lá atrás, nós também tivemos o apoio do presidente Lula para trazer a Escola Técnica, hoje chamada de Instituto Federal, o Ifap. Já temos um aqui na zona norte, em Macapá, outro do Jari e já estão começando o de Santana e o de Porto Grande. Além disso, temos ainda as usinas hidrelétricas saindo, a de Ferreira Gomes, a de Caldeirão, em Porto Grande, ou seja, no Amapá as coisas estão acontecendo, com as empresas de mineração aí, com outras chegando e nós vamos melhorar esse porto, enfim, são tarefas grandes que precisam ser feitas para se dar trabalho para o povo.

Pergunta – Fim do ano é sempre um momento pra essas avaliações, não é mesmo?
Sarney – Esse tempo do Natal é também para se homenagear o povo amapaense, especialmente as mulheres do Amapá, pois nesse mês a figura central é o menino Jesus que através do Presépio lembramos de Maria, que representa todas as mães, pois cada um de nós que vem ao mundo é só através de uma mulher, pois elas é que são o verdadeiro fundamento de uma família.

Pergunta – Foi num 19 de dezembro, só que em 1985 que o senhor como Presidente da República proibiu a caça às baleias no Brasil. Lembra disso?
Sarney – Lembro sim. Havia um movimento feito pelas crianças do Brasil e que me tocava muito. Eu sempre fui um homem tocado pelas questões ambientais, tanto que o primeiro discurso feito no Congresso dentro da visão científica da necessidade de preservarmos a natureza foi feito por mim, em 1972, quando se realizava a Conferência de Estocolmo. Como Presidente da República criei o programa Nossa Natureza, o Ibama e todo esse conjunto de leis que protegem hoje o meio ambiente. Mas, quanto às baleias, nós não podíamos permitir que continuassem com aquela crueldade com as baleias que passavam pelo Atlântico na costa do Brasil. Eles argumentavam que Cabedelo vivia da pesca da baleia, mas eu resolvi proibir e felizmente desapareceu isso do Brasil, pois quase que acabam com as baleias do mundo.

Pergunta – O senhor participou recentemente nos funerais do ex-presidente Nelson Mandela, na África do Sul, em meio a uma comoção mundial e com a curiosa participação de ex-presidentes do Brasil. Como foi isso?
Sarney – Foi uma solenidade tão comovente em que nós devolvíamos ao solo da África do Sul a relíquia do corpo de Mandela, que era um símbolo acima de tudo, que não foi um homem de luta, ele foi um homem de paz, porque ele trouxe a paz para o seu país, quando todos pensavam que em seu coração crescia a vingança, na verdade crescia o amor. É esse o exemplo que ele dá para a humanidade e foi assim que ele fez a África do Sul continuar sendo um grande país, que inclusive hoje faz parte dos Bricks, os países emergentes, que são o Brasil, Índia, China e África do Sul.

Pergunta – O senhor quando presidente foi quem criou a chamada Abertura Democrática e iniciou a transição do Regime Militar para a Democracia. O Brasil de hoje, com manifestações de rua, violência nas ruas e nos estádios de futebol, isso assusta o senhor ou é o preço que devemos pagar para termos uma democracia plena?
Sarney – É o preço que nós temos que pagar pela liberdade que nós devolvemos ao povo brasileiro, os ventos da liberdade varrendo. Agora muitos usam da liberdade para cometer excessos. O que nós temos é que tomar providências com cada vez mais energia evitar que a violência seja uma deformação da liberdade. A democracia é o caminho do desenvolvimento, é o melhor caminho que pode ter. É o regime do autogoverno que nós pregamos e que eu tive realmente a oportunidade de presidir a transição democrática do Brasil e vejo hoje com grande felicidade esse país extraordinário com liberdade em todos os cantos e desapareceu qualquer tentativa de golpe e passou a ser um país muito mais justo, muito mais humano e com grande participação social.

Pergunta – Obrigado pela entrevista.
Sarney – Eu que agradeço, quero deixar o meu abraço a todos e desejar um Natal e o Ano-Novo muito bom.

Pergunta – Úma última pergunta. O senhor vai se candidatar à reeleição?
Sarney – Eu acho cedo ainda para tratar disso, mas vai depender de muitas coisas, inclusive até mesmo as minhas condições físicas. Que atualmente eu acho muito boas... [risos] Graças a Deus!

Perfil...

Entrevistado. José de Ribamar Sarney Costa tem 83 anos de idade, é advogado, jornalista e escritor. Começou a vida política ainda estudante do Colégio Liceu, em São Luís (MA), tendo depois chegado a suplente de deputado federal, até vencer uma eleição para a Câmara Federal e depois elegeu-se governador do Maranhão e depois senador. Nos anos 1980 engajou-se na campanha pelas eleições diretas e pouco depois compôs como vice a chapa vitoriosa do Presidente Tancredo Neves, que faleceu antes da posse. Sarney assumiu as rédeas do país e conduziu o período da redemocratização, da Constituinte e da volta das eleições diretas para Presidente. Depois foi eleito senador pelo Amapá e está no terceiro mandato, portanto há quase 24 anos.

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