Com sua vasta experiência administrativa e política, o economista analisa a atual conjuntura da transição. |
Cleber Barbosa
Da Redação
Diário do Amapá – Qual sua opinião sobre o atual momento administrativo do Amapá, não apenas o fim de um exercício financeiro, mas de um período de governo?
Jurandil Juarez – Infelizmente nós estamos tendo outro final de mandato com muitos problemas. A maturidade, o fato da gente já ter experimentado essas situações no passado, já recomendaria que nós tivéssemos um certo norte, uma norma em que se estabeleceria a transição. Ninguém ganha com isso. O que sai deixa uma situação difícil e o que vai entrar vai ter que arcar com isso e nós já estamos acostumados a ouvir aquela expressão que ficou até comum, a herança maldita, como se alguém herdasse alguma coisa.
Diário – E não herda?
Jurandil – Na verdade a gente tem que entender que na democracia isso é fixado, os mandatos são de quatro anos que pode ser renovado uma vez, no caso do Poder Executivo, portanto todas as vezes que você fosse fechar um exercício financeiro de mandato, você já deveria estar com tudo pronto, está aí a Lei de Responsabilidade Fiscal regulando isso. Só assim a transição seria uma coisa tão natural que não se perceberia. Mas o que se vê agora é quase uma contenda para que isso aconteça.
Diário – E tudo gira em torno do orçamento, das finanças e até dívidas.
Jurandil – O orçamento, na verdade, é proposto fora da realidade. Eu acho que quem propõe o orçamento não tem muita responsabilidade com a sua execução, porque são tantas as alterações que são feitas durante o período anual de execução, que passam as vezes de 100, pois tem um decreto que já fica autorizado. Os projetos de lei para mudar o orçamento também são uma forma de fazer essas mudanças. É o famoso “de – para”, ou seja, tira de um lugar e passa para outro, reconfigurando totalmente o orçamento, o que significa dizer que é uma lei não cumprida, aquilo que muita gente diz que no Brasil tem lei que pega e outras que não pegam. O orçamento basicamente é uma lei que não pega... [risos]
Diário – É uma peça de ficção também se diz a respeito da LOA [Lei Orçamentária Anual], pois é feira em cima de uma previsão de arrecadação, que nem sempre se concretiza, ou seja, o que foi orçado não se configura em financeiro?
Jurandil - É verdade, mas não seria por isso, é mais para o lado da despesa, não pelo lado da receita. Porque a receita, como há uma previsão, e uma precisão segura de um histórico de muitos anos. Quanto é o FPE, por exemplo? Que é a participação que o estado tem num fundo que é composto pelo Imposto de Renda e pelo Imposto sobre Produtos Industrializados, essa previsão vem do Tesouro Nacional, que diz qual a expectativa de recurso que você tem para usar no FPE. A outra grande receita é o ICMS, que já se tem uma larga experiência de saber qual a tendência de crescimento ou de decrescimento. Quando você diz previsão é porque você ainda não arrecadou.
Diário – E sobre essa polêmica em torno do pedido de suplementação orçamentária feito pelo governo do estado?
Jurandil – Esse projeto que está na Assembleia [Legislativa] é para mudança da despesa, não é na receita. Se fosse para mexer na receita teria que ser num projeto de lei reduzindo o orçamento, o que você está querendo é remanejar para aumentar a despesa, o que significa dizer que você tem uma peça de ficção mas pelo lado da despesa, porque se orçou mal, porque o orçamento é praticamente todo engessado, ele tem limites para a educação, para a saúde, para o Pasep, tem o Fundeb, enfim, ele é todo vinculado e as despesas se repetem a cada ano, ou seja, quando você entra em janeiro já sabe que está devendo o mês de dezembro porque vai contratar pessoal para fazer aquele trabalho. E se chegar em dezembro e dizer que não tem dinheiro para pagar o 13º salário isso não é problema de orçamento é problema de gestão.
Diário – E essa polêmica em torno de certames licitatórios que estão sendo abertos agora pelo governo do estado, ao apagar das luzes da atual gestão?
Jurandil – Eu fiquei surpreso com isso. Porque se você está com problema nas despesas, o certo era definir o que é prioridade. Por exemplo, se tiver faltando medicamento, você não vai esperar que o próximo governador assuma para fazer um processo licitatório porque essas são despesas continuadas, ou seja, você tem que ter medicamentos nos hospitais. Mas claramente outras [despesas] podem ser deixadas para o ano que vem, então não é normal você ter tantos certames licitatórios ao final de um exercício, principalmente ao final de um mandato. Aliás a Lei de Responsabilidade Fiscal, não que proíba, mas ela orienta no sentido de que só aquilo que é essencial.
Diário – O senhor falou sobre a importância de se ter um acompanhamento histórico das previsões orçamentárias, especialmente dos repasses constitucionais como do FPE. Os números são conta de que haverá uma redução considerável no próximo ano não é?
Jurandil – A Secretaria do Tesouro está informando o FPE que será disponibilizado pro Amapá em R$ 2,481 bilhões. Se você for verificar o que foi realizado até agora é R$ 2,240 bilhões, menos a primeira parcela, diz 10 de dezembro, que foi de R$ 113 milhões, mas ficará tão próximo que estatisticamente estava correta a projeção. Já a projeção da LOA para 2015 é de R$ 2,904 bilhões, mas o Tesouro Nacional, que é quem repassa esse recurso, está dizendo que só vai repassar R$ 2,814 bilhões, então quem elaborou a Lei orçamentária Anual o fez com R$ 90 milhões a mais para a previsão do FPE. Com as implicações que isso tem no Fundeb, por exemplo, de 20%, você já terá R$ 18 milhões a menos nesta outra importante fonte.
Diário – E o foro apropriado para se fazer esses ajustes na LOA é mesmo o Parlamento Estadual não é?
Jurandil – É verdade. Mas na questão da receita já ficou provado que não, inclusive o PSB entrou com uma ação direta de inconstitucionalidade contra a Assembleia dizendo que ela não podia mexer na receita, naquela primeira discussão que houve em 2012, quando foi mexido na receita para mais. E o Supremo Tribunal Federal declarou que essa é uma tese cediça, pois é claro que pode mexer na receita, só não pode na despesa sem dizer o que você vai fazer com ela.
Diário – A expectativa então é que o ano de 2015 seja de orçamento mais apertado para o novo governador?
Jurandil – Não tenho dúvida quanto a isso. Apertado pelo lado da receita, mas principalmente pelo lado da despesa. O que está se observando hoje é que o superávit que era previsto não vai acontecer, o endividamento do estado está muito acima da sua capacidade de pagar, e não estou só falando dos empréstimos do BNDES. Estou falando do endividamento previdenciário, que já é enorme e os servidores, suas organizações de classe devem ficar atentas para o fato de que daqui a dez anos por exemplo, se continuar desse jeito, poderá comprometer as aposentadorias, isso precisa ficar claro.
Diário – Mas uma mudança de governo é sempre um período de muita expectativa. Por que o amapaense pode ter motivos para acreditar em dias melhores? Tem uma área em que o senhor apostaria suas fichas?
Jurandil – O quadro não é bom. Agora, todas as mudanças trazem expectativas de que vamos ter notícias boas, nos traz esperança. E eu acredito que só essa mudança, só o fato de mudar, já ajuda. É como alguém que está doente e vai visitar um novo médico, já chega lá mais ou menos melhorado... [mais risos] Então essa mudança vai ser benéfica sim. No campo na economia o que acredito que o governador Waldez fará é racionalizar a produção do agronegócio e quando digo racionalizar é tirar o estado do caminho, pois está atrapalhando, pois o PIB do Amapá tem vergonhosos 3% da produção agrícola. E 3% é margem de erro dos institutos de pesquisa, ou seja, é insignificante.
Perfil
Entrevistado. Jurandil dos Santos Juarez nasceu em Afuá (PA) em 12 de março de 1950. É economista, professor Universitário e político amapaense filiado ao PROS (Partido Republicano da Ordem Social), mas com uma longa passagem pelo PMDB (Partido do Movimento Democrático Brasileiro). Foi vereador em Macapá, de 1986 a 1999 e foi deputado federal pelo estado do Amapá por três legislaturas, de 1999 a 2011. Intercalou passagens por importantes cargos da administração estadual, como secretário de Finanças (1985-1986), Coordenador de Planejamento e depois Secretário Executivo da Aster-Amapá; Secretário de Estado da Indústria, Comércio e Mineração (2003-2004) e Secretário do Planejamento (2005-2009).
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