José Luciano. Para o magistrado, a tal ‘judicialização da saúde’ mesmo com desgaste, está sim produzindo respostas à população. |
Cleber Barbosa
Da Redação
Diário do Amapá – Este ano o senhor não está atuando na Justiça Eleitoral, que a gente sabe dá um trabalho danado aos senhores, mas que deve ser gratificante do ponto de vista de ser protagonista de um momento único que são as eleições, não é?
Luciano Assis – Ah, tranquilo! E a Justiça Eleitoral tem uma particularidade que é o trabalho em forma de rodízio então o meu alívio não é por estar me desligando do serviço, mas é que é a oportunidade para que outros colegas atuarem. Hoje a Justiça Eleitoral está em boas mãos com o doutor Reginaldo, César Scapin, nas zonas eleitorais, bem como os juízes eleitorais que compõem o TRE, que vai ser o grande protagonista destas eleições.
Diário – Circulam nas redes sociais, nos bastidores da política como um todo a expressão ‘judicialização da saúde’, que se verifica nas disputas do carnaval, dos concursos de beleza, do futebol, pois aqui dizem que tudo termina na Justiça. Isso não afere um grau de confiabilidade no Judiciário também?
Luciano – Veja só, guardadas as proporções, quando a gente fala da judicialização da saúde podemos dizer que a busca ao Judiciário para resolver os problemas do setor mostra que as instituições estão para servir ao povo. Então se o Estado e a administração não conseguiram resolver administrativamente as suas obrigações constitucionais, cabe ao Judiciário essas hipóteses intervir e fazer com que cada Poder, cada ente público, cumpra o seu papel. E a saúde, não só no Amapá como no Brasil todo, sofre dessas mazelas, com a falta de recursos, a má gestão da administração pública leva a esse desconforto, essa falta de atenção para com a população, que pede, que clama por saúde né?
Diário – Com certeza.
Luciano – Saúde preventiva acima de tudo. E hoje o Judiciário virou uma verdadeira justiça de reparação, então o Judiciário contribui com ações no sentido de fornecer medicamentos, realizar procedimentos cirúrgicos, internações, enfim, mas é uma forma democrática, faz parte do jogo, a intervenção do Judiciário nessas hipóteses.
Diário – Daí a gente falar em confiança do Judiciário resolver certos litígios.
Luciano – Só não compara ao Carnaval ou aos concursos de beleza porque eu acho que quem vai à Justiça brigar por escola de samba ou concurso de miss não tem muita razão de ser nesses nossos ambientes... [risos]
Diário – Mas que também é legítimo não é?
Luciano – Exatamente, é a garantia constitucional do livre acesso à Justiça, então aquele que se sentir com seu direito ofendido eu acho que tem mais do que exercer esse direito de ir à Justiça bater suas portas.
Diário – O senhor atua hoje no Juizado Especial da Fazenda Pública, qual o mote dele?
Luciano – O juizado da Fazenda Pública virou uma espécie de vedete, sabe? No âmbito dos litígios da Fazenda Pública, com a administração pública do Estado, do município de Macapá também, de modo que as demandas que não ultrapassam 60 salários mínimos, que é a grande maioria das questões que envolvem a administração pública, desaguam no nosso juizado, de modo que temos hoje uma demanda crescente, irreversível, no âmbito dos juizados especiais, pois para se ter uma ideia congregamos 13% de toda a demanda do Estado do Amapá.
Diário – Parece muita coisa mesmo.
Luciano – Isso, uma única unidade judiciária já tem 13% de todos os processos em trâmite no Estado do Amapá. É uma procura vertiginosa, com destaque especial e é onde eu dou bastante atenção, para as demandas de saúde, de modo que o juizado tem sido hoje a última porta do paciente né? Ele não consegue atendimento, não consegue medicamento ou o procedimento cirúrgico ele corre lá pro juizado e com a nossa intervenção temos conseguido bons resultados.
Diário – E a estratégia para dar conta do volume de ações?
Luciano – Agimos mais com atos de gestão do que de julgamentos. Nós firmamos parcerias com a Secretaria de Estado da Saúde, hoje sob a batuta do secretário Jardel Nunes, que tem mostrado assim grande interesse de solucionar as demandas que já estão judicializadas. São realizações de mutirões, facilitação de acesso do judiciário aos recursos públicos para suprir as necessidades, de modo que muito ao contrário do que pensam, de que o juiz manda prender porque não cumpriu ordem ou em torno disso, no juizado temos agido de uma forma muito mais pacífica, muito mais entrosada e atendendo satisfatoriamente os interesses das partes que procuram.
Diário – Importante.
Luciano – Tanto com relação ao tratamento fora do domicílio, quanto da própria Secretaria da Saúde, as dificuldades existem, mas elas estão sendo superadas, não com conflitos, com embates do Judiciário em relação ao Executivo, mas com uma forma de entrelaçamento de mãos em busca de soluções para aqueles que procuram a Justiça.
Diário – Já que o senhor citou esse caso concreto, do secretário Jardel, que teve a prisão decretada no Tribunal, como esse caso subiu para o chamado segundo grau?
Luciano – Olha só, o jurisdicionado tem condições, tem vários caminhos dentro da Justiça. As vezes eles procuram os caminhos mais tortuosos e procuram demandar diretamente contra o secretário de Estado e assim a competência, pela prerrogativa de foro, é do Tribunal de Justiça. E dependendo da ação que é movida, não há muitas alternativas para o julgador, entendeu? Então é uma busca tortuosa. No Juizado da Fazenda Pública o juiz é muito mais maleável, ele tem um leque de opções para atuar. Exemplos: se por ventura o Estado não consegue cumprir, não porque não queira, mas porque não há tempo suficiente, por conta da burocracia estatal, por conta até mesmo da legislação que rege as licitações, não consegue comprar um remédio, não consegue a tempo e modo na urgência que o paciente quer, o juiz pode valer-se de outras medidas como o bloqueio de recursos suficientes, sequestro de valores, entendeu? E nesse sentido eu consigo satisfazer os interesses das partes.
Diário – Nessa questão do cobertor ser curto para o atendimento de todas as demandas, existem muitos casos da estrutura existente não ser suficiente e tantos os médicos como as autoridades do setor acabam tendo que eleger quem deve ter atendimento prioritário, para cirurgias, por exemplo, ou o uso de respiradores, UTI’s e por aí. O senhor já teve que se deparar com uma decisão como essa de escolher quem terá acesso primeiro a uma resposta da saúde pública?
Luciano – Esse é o ponto mais delicado, onde a administração pública de modo geral, procura se escudar nesses discursos de que existem muitas cirurgias para fazer, então quem busca o judiciário acaba furando a fila, entendeu? Mas eu não posso fechar os olhos para aquele que procura o Judiciário e prestigiar aquele que nem foi à Justiça. Eu não tenho aqui uma Câmara Reguladora para estabelecer uma determinada regra e eu não tenho a segurança de que todas essas cirurgias colocadas dentro de uma determinada ordem serão religiosamente cumpridas. Então quem me procura será atendido.
Diário – Obrigado pela entrevista doutor.
Luciano – Eu que agradeço pela oportunidade e gostaria de dizer que o Juizado está de portas abertas para toda a população. Estamos ali no prédio da Padre Júlio esquina com a Odilardo Silva, gratuitamente, desde que os interesses não tenham valor acima de 60 salários mínimos, o que hoje passa um pouco aí dos R$ 40 mil reais. Estamos à inteira disposição.
Perfil
Entrevistado. José Luciano de Assis é natural de Dourados, Mato Grosso do Sul, tem 48 anos de idade, é casado e é formado em Direito pela Unigran (Universidade da Grande Dourados), com especialização em Processo Civil pela Faculdade Estácio de Sá. É professor universitário de algumas importantes faculdades do Amapá. Foi advogado militante por mais de cinco anos até ingressar por concurso público na carreira da magistratura, em 1991, no então criado Estado do Amapá, portanto é um dos precursores do Judiciário do Amapá. Atualmente não está compondo a Justiça Eleitoral, onde se notabilizou como juiz titular da 10ª Zona Eleitoral, em Macapá. O magistrado atua como juiz de Direito da Vara da Fazenda Pública, na Comarca de Macapá.
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